A estranha apatia soava-lhe a mordomia pelo luxo de esbanjar o tempo num tranquilo vegetar.
Ruminava pensamentos enquanto pastava sofrimentos num campo lavrado pela sua imaginação. Prisioneiro da inércia, sonhava impossíveis aos quais chamava libertação.
Voava quando queria, acordava quando batia contra as grades invisíveis da sua gaiola interior. Preso ao amor, agarrava-se a um poleiro e cantava para espantar as aflições.
Asas amarradas pelas esperanças frustradas, fechado num pequeno pedaço de si.
À beira do bebedouro sorvia o desespero e mirrava de sede à espera de uma gota de orvalho que pendia teimosa, lá no alto, na ponta da árvore em forma de nuvem que cobria o sol.
Fazia-lhe mal, a insistência desastrada numa existência amargurada por algo que não existia afinal. Pura fantasia da qual nunca desistia até chegar o momento oportuno, eternamente amanhã.
E esse dia nasceu, ou antes explodiu como uma granada. Uma verdade revelada, dinamite, consciência recuperada na ressaca de um safanão.
Ergueu-se do chão como um mártir ressuscitado, um colosso despertado do torpor.
E depois o seu tempo acabou.