25.6.08

PAGO A PRONTO (Dez 2005)

Queria que a verdade prevalecesse. Integra, total. Não gosto de meias verdades e encaro como repugnantes as mentiras por omissão ou as mentiras piedosas que se utilizam para escamotear as realidades que queremos ver escondidas no fundo do baú. Como em qualquer mentira, afinal.Não entendo porque fugimos como coelhos assustados para uma toca qualquer, sempre que não conseguimos enfrentar as consequências do que fomos na interpretação do que somos e do que afirmamos ser. Não entendo porque hipotecamos a confiança dos outros por medo das nossas revelações. E nem quero entender.

Queria apenas que a verdade servisse em todas as ocasiões e não apenas nas que nos servem qualquer propósito, legítimo. Queria que as mentiras e as omissões não minassem a confiança total que gosto de depositar nas pessoas, não me obrigassem a todo o instante a analisar incongruências e a pedir para elas uma justificação. Que chega trapalhona, envergonhada, camuflada num lapso de memória que alivia o desconforto de quem prefere fugir.

Queria que a coragem andasse de mãos dadas com todo o tipo de emoções. A verdade surgiria como uma consequência natural, pois a mentira e a sua amiga omissão servem apenas como tábuas de salvação efémeras para o que a vida se encarrega de descobrir, depois. Por acaso, ou talvez não...

Queria que os outros não receassem arriscar, que apostassem na minha lealdade, na minha capacidade para ser o fiel depositário de todos os seus medos, de todas as verdades temidas que só não corroem quando expurgadas, quando contadas a quem as mereça e saiba ouvir. As mentiras, como as omissões, posicionam-se num espaço negro da nossa consciência e envenenam-nos as reacções. Ficam demasiado próximas da traição.

Queria que as coisas acontecessem com espontaneidade, coerentes, frontais. Que as peças do puzzle não fossem apenas pedaços mal encaixados pelo esforço inútil do meu raciocínio ou da minha imaginação.

Queria a confiança dos outros para lhes poder provar a minha, sólida e incondicional.Tenho para mim como certa uma vida feita de utopias, de ilusões, de histórias mal contadas que me induzem à desconfiança e ao temor.Nunca saberei perdoar a quem algum dia me enganou, nos pequenos detalhes como nas coisas relevantes. Não sei perdoar a cobardia nem recuperar a confiança que me escamoteiam.

Não sei entregar-me às prestações.

22.6.08

SUMMERTIME


18.6.08

FEIOS, PORCOS E MAUS (Nov 2005)

Este não é, nem pode ser, um tema agradável. Convivi com o fenómeno até aos treze anos de idade, altura em que consegui impor pela força o fim de algo a que quis poupar uma irmã mais nova por quem me preocupava nessa altura.A violência doméstica é um pesadelo sem sentido, é uma exibição grotesca de selvajaria com palco no que deveria ser um santuário para qualquer pessoa: a sua própria casa.

Na esmagadora maioria dos casos são mulheres as vítimas. Isto explica-se pelas abjectas questões ditas culturais (a educação que "os" perdoa), pela escassez de opções de quem sofre às mãos de um algoz "da casa" e, santa paciência, pela lei da selva onde o mais forte impõe esta regra medonha à bruta. Uma cobardia, sob qualquer prisma. E uma indignidade também, mesmo que de violência psicológica se trate.A dor de quem se vê refém de um filme assim não se mede pelo teor das sevícias praticadas. Violência é violência e o resto são tretas.

Já falei neste espaço acerca do martírio que hoje está na ordem do dia. Aumentam os casos reportados às autoridades e mesmo que isso reflicta apenas o facto de mais gente avançar com a imprescindível denúncia, é uma estatística que nos envergonha em pleno século XXI.Não há atenuantes para a violência doméstica. A própria expressão engloba o quão nojenta se revela esta manifestação de instintos pré-históricos por parte de alguns neandertais cujo lugar adequado é uma cela. Ou, perdoem-me a franqueza, uma cama de hospital (tá bem, pode ser no Miguel Bombarda...).
Insisto nesta tecla porque nunca é demais apontar o dedo às vergonhas e chamá-las pelos nomes, para que nenhum bandalho se consiga sentir mais macho por dominar a murro a sua companheira (e/ou o resto da família). É assim a realidade nua e crua e não existem paninhos quentes que a pintem de um tom menos hostil.Este ano já morreram mais de trinta mulheres às mãos dos seus carrascos cruéis. Mais de trinta. As que morreram, pois as queixas são às centenas e os silêncios representam milhares.
É um problema, é uma vergonha.

E tem que acabar, de uma vez por todas.

15.6.08

A LUA E O FALSO COMETA

12.6.08

RASTOS DE MIM (Out 2005)

Posso morrer amanhã. Não faço ideia. E por isso preciso deixar ditas as coisas que nunca poderiam ficar por dizer.Porque o tempo avisa-nos da sua correria, mas nós fazemo-nos esquecidos e deixamos sempre para o dia seguinte as tarefas que achamos possíveis de realizar na boa. Amanhã ou depois.Mas não é assim que a coisa funciona.

Recuso a noção da vida como um dado adquirido, como uma companheira leal e dedicada que temos por certa ao nosso lado e nada fazemos por conservar. Está ali e pronto.Não. Eu prefiro acreditar no tal piano de cauda que pode mesmo aterrar-me na mona e mandar-me desta pra melhor. Ou pior, feito num harmónio que mal consiga tocar as notas baixas da sobrevivência precária. Prefiro encarar de frente a minha condição de mortal construído com materiais muito flexíveis mas de resistência duvidosa, menos rijos do que a maior parte do que me rodeia.Parece pessimista? Não é.

Até poderei estar a blogar na plena posse das minhas faculdades daqui a vinte anos. O que direi nessa altura poderá ser dito tarde demais para produzir o efeito que hoje alcançaria. Rejeito a possibilidade de me arrepender então. Antes opto por arriscar falar demais, por deixar no que escrevo, no que digo e no que faço a marca da minha passagem por este mundo e a da passagem dos outros nos cruzamentos da minha. Poucos(as) seguem ainda no mesmo trajecto que eu, lado a lado, por uma data de razões que este blogue algures explicou ou explicará. E é a essa minúscula multidão que devo o penhor da minha gratidão, as palavras que agradecem o bem que o seu amor me faz e o quanto se revelam determinantes aos meus olhos.

A minha felicidade é avessa à solidão e esta é o meu maior terror. Só me protege o amor e é esse que me esforço por louvar, aqui e noutros suportes (como a vida que se faz lá fora). Sou grato a quem me ama e a quem me oferece o pretexto, a própria pessoa, especial, para também eu conhecer de perto o arrebatamento da paixão. A minha alegria é feita das emoções que me fazem sentir vivo como deve ser.Feliz porque tenho com quem me partilhar, com quem chorar, com quem rir às gargalhadas em noites bem passadas e com quem fazer o melhor amor que o mundo conheceu. Esse sou eu. Um gajo capaz de morrer amanhã, cujas pegadas não sejam sopradas pelo vento, confiadas ao esquecimento por não haver quem sinta saudades quando me ausentar de vez. Por não haver quem me queira recordar. Essa é a morte verdadeira para mim.

A vida é o espaço que me foi destinado para dar conta de mim nas pessoas que o destino encaminhou para um rumo paralelo ao meu. As pessoas que me interessam, interessadas pelo que tenha de bom para lhes dar. As pessoas que me querem amar, generosas, para elas as prosas que consigo debitar. Mais a certeza do meu melhor, reservado a quem o saiba merecer, dentro dos critérios que estabeleci e aceito sem reservas negociar. Cedências. E outras exigências consentidas pelo amor.Uma equilibrada permuta em que ninguém saia a perder.Eu sonho conseguir o equilíbrio em mim na gestão razoável de um coração inesgotável enquanto receptáculo do amor, o de pai também. Também sonho ultrapassar um dia a mais exigente fasquia e perceber, no fim, que amei alguém até esse suspiro final da minha paixão. Tenho a razão e pretendo prová-la em vida, para deixar a quem me suceda um mapa bem traçado do que vale a pena cultivar. O tesouro da amizade e do amor, dos prazeres que a vida nos dá, de bandeja, coisas divinais. E ao alcance do mais comum dos mortais.

Luto pela conquista do amor e ainda com mais ardor quando está em causa a sua preservação. Um amor verdadeiro não se pode substituir, apenas se disfarçam as mazelas resultantes da sua inexplicável extinção. Tapam-se os buracos na alma com remendos de euforia para colmatar as lacunas de emoção. Eu recuso aceitar males menores. Quero amar a sério até ao fim, é esse o estandarte que carregarei enquanto respirar e que me identificará na última morada, depois.Agora está na hora de me embebedar de paixão, de mergulhar no espaço que a vida me dá e sentir nas veias o sangue a pulsar. Acelerado pela chama que me orgulha atiçar.

Agora está na hora de amar.

5.6.08

A POSTA NO ARAME (Set 2005)

Tenho palavras encarceradas em mim. E não as posso libertar assim.São reféns das minhas limitações. Condenadas ao silêncio das palavras marginais que podem incomodar.Sinto-me prisioneiro e afinal sou o carcereiro das utopias e ilusões que pretendo conquistar.
Ambiciono palavras soltas, mas faço orelhas moucas à verdade que se perdeu.
Amordaçado pelas condições, sonho novas revoluções nas arestas da que Abril me deu.
No calor da madrugada, busco a escrita transpirada e a vontade de gritar não!

Mas sinto-me gelado pelo ar condicionado da minha liberdade de expressão.

3.6.08